A revolução da internet e o avanço das redes sociais mudou muitas coisas nas escolas. Hoje, vivemos uma transformação digital na educação, com novas metodologias de ensino e possibilidades educacionais, mas também com novos problemas — ou velhos problemas, traduzidos em novas “linguagens”. É o caso do cyberbullying.
A violência e a humilhação do bullying tradicional já são desafios muito conhecidos na realidade educacional e continuam presentes na educação de hoje.
🔎 Leia nosso conteúdo sobre bullying: O que é bullying na escola e como combater essa prática?
No entanto, a versão digital desse tipo de agressão — tão comum quanto prejudicial na idade escolar — vem crescendo e tomando proporções preocupantes.
E ela está presente em qualquer instituição. Se a gestão ainda não percebeu os impactos do cyberbullying em sua escola, talvez sua equipe não esteja olhando para os sinais certos.
Para saber mais sobre o assunto e ajudar a cuidar do bem-estar, dos relacionamentos e da saúde mental de seus estudantes, continue a leitura:
- O que é o cyberbullying?
- Por que combater o bullying na gestão educacional?
- Como identificar essa prática em sua escola?
- Como prevenir e combater o cyberbullying?
O que é o cyberbullying?
Para começar a combater esse sério problema na realidade escolar, é preciso, primeiro, compreender o que ele é, como funciona e quais são suas consequências.
Acabamos de mencionar que o cyberbullying seria como uma “versão digital” do bullying tradicional. Contudo, essa é uma simplificação que serve apenas para começar a entender a questão. Para realmente lidar com ela, é essencial ir mais fundo.
Como você já sabe, o bullying é uma forma de agressão que envolve violências físicas, verbais e psicológicas — muitas vezes ao mesmo tempo — em um ambiente escolar.
São consideradas nessa categoria agressões sistemáticas e contínuas, que fazem a vítima sentir-se excluída da vida social e insegura com sua própria aparência ou comportamento, que costumam ser os principais alvos dos agressores.
O cyberbullying é uma extensão dessa violência, mas praticada no ambiente virtual e com algumas situações particulares.
Ele ocorre por meio de e-mails, aplicativos de mensagens, fóruns e, principalmente, redes sociais. Essas práticas envolvem perseguição, calúnia, difamação, exposição vexatória, humilhação, intimidação e outras formas de violência.
Algumas das práticas mais comuns são o compartilhamento de fotos constrangedoras ou mentiras sobre alguém nas redes sociais, além da descriminação dessa pessoa nos espaços digitais e o envio de mensagens humilhantes ou ameaçadoras.
Assim como no bullying tradicional, essas violências muitas vezes são disfarçadas ou encaradas como “brincadeiras”.
As principais diferenças entre as formas de bullying, portanto, não se resumem apenas ao uso de plataformas digitais. É preciso levar em conta que o cyberbullying não envolve, diretamente, a violência física. Contudo, ele transcende com muito mais facilidade o ambiente escolar, atingindo a vítima onde quer que ela esteja, inclusive em casa.
Ainda assim, é importante lembrar que um tipo de bullying não exclui o outro. Situações de cyberbullying podem acabar levando a práticas de violência física ou agressões verbais e psicológicas em um ambiente presencial.
Ao mesmo tempo, crianças e adolescentes que sofrem com o bullying tradicional geralmente são vítimas mais frequentes da agressão virtual.
Além disso, o cyberbullying também é uma violência e não é “menor” ou menos prejudicial do que as agressões presenciais.
Por que combater o bullying na gestão educacional?
O grande problema do bullying, para suas vítimas, é que ele parece inescapável. Afinal, durante o período escolar, a criança ou adolescente têm na instituição sua principal experiência social. Quando esse espaço se torna inóspito, o aluno pode sentir-se inadequado e “condenado” a ser excluído do convívio com os demais.
Nesse sentido, o cyberbullying merece uma atenção especial. Há quem considere que essa agressão digital é menos impactante, pois não envolve a violência física. No entanto, ela pode ser ainda pior porque as vítimas não têm para onde fugir.
Enquanto o aluno pode “desligar-se” da agressão do bullying tradicional enquanto está em casa, quando essa violência ocorre de forma digital, ela o persegue onde quer que esteja — só precisa estar conectado à internet.
Com o aumento do uso das redes sociais, essa situação se agravou, porque o mundo digital passou a estar totalmente integrado à sociabilidade das crianças e adolescentes
Nesse contexto, dados de 2019 apontam que um em cada dez adolescentes (13,2%) já se sentiu ameaçado, ofendido e humilhado em redes sociais ou aplicativos.
As informações são da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2019, divulgada em 2021 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e compartilhada pela Agência Brasil.
Os dados foram coletados antes da pandemia de covid-19, período em que o uso de redes sociais se intensificou. A expectativa, portanto, é que os números tenham aumentado desde então.
A pesquisa ainda indica que 23% dos estudantes dizem ter sido vítimas de algum tipo de bullying nos 30 dias anteriores ao questionamento. Ela aponta ainda, como principais motivos para a agressão, a aparência do corpo (16,5%), a aparência do rosto (11,6%) e a cor ou raça (4,6%).
O impacto dessa violência na saúde mental dos alunos é considerável. A mesma pesquisa indicou que 21,4% dos alunos afirmaram que a vida não valia a pena ser vivida. Do total, 50,6% disseram que sentem-se preocupados com coisas comuns do dia a dia.
Outro ponto importante do estudo é a insatisfação com o próprio corpo. Menos da metade dos alunos disse achar seu corpo normal, enquanto 28,9% se achavam magros ou muito magros e 20,6%, gordos ou muito gordos.
Considerando tudo isso, fica clara a importância de lidar com o cyberbullying na gestão escolar. Esse cuidado é fundamental para proteger a saúde mental dos estudantes de sua instituição.
Leia mais: Saúde mental dos alunos: como trabalhar esse tema nas escolas?
Vale reforçar, ainda, que sem a atenção da equipe pedagógica, o bullying pode acabar criando um ambiente de violência. Se sua escola for um espaço em que a agressão é normalizada, ela estará formando pessoas “programadas” com essa mentalidade. Sejam elas vítimas ou agressores, o impacto para sua formação é profundamente prejudicial.
O bullying prejudica não apenas a vítima, mas também o agressor e as pessoas em seu entorno.
Sem falar que o ambiente de violência prejudica a própria autoridade do professor — que pode acabar também sendo vítima de agressores mais ousados. Isso é um problema para toda a organização escolar.
Além disso, a agressão têm um impacto na própria relação ensino/aprendizagem. Crianças e adolescentes vítimas de bullying não conseguem aproveitar adequadamente as lições — tanto que a queda no desempenho escolar é um dos sinais mais claros da situação.
Por fim, esse tipo de violência tem consequências financeiras na gestão escolar, principalmente no que diz respeito à retenção de alunos. A vítima tende a relacionar a agressão ao espaço da escola e, muitas vezes, não quer voltar.
Mesmo que o cyberbullying não seja realizado na escola, a gestão escolar possui responsabilidades em lidar com ele, porque as repercussões geralmente afetarão o espaço de socialização dos estudantes que é, principalmente, a instituição de ensino.
Como identificar essa prática em sua escola?
O primeiro passo para combater o cyberbullying é identificar essa prática em sua escola. As duas principais técnicas para fazer isso são:
- Monitoramento das redes sociais e aplicativos
Como o cyberbullying acontece em ambientes digitais, monitorar esses espaços parece ser a estratégia mais lógica para identificar o problema em uma escola.
No entanto, essa é uma prática muito desafiadora, pois o mundo digital é imenso e é difícil para a equipe pedagógica da escola acompanhar tudo — ainda mais quando o bullying ocorre em espaços privados, que não podem ser acessados pela gestão.
Por isso, o monitoramento deve funcionar como uma prática complementar. Vigie as redes sociais da instituição e os aplicativos de comunicação escolar para ver se há alguma atitude de violência.
Caso um aluno sofra agressões presencialmente ou apresente um comportamento estranho (falaremos mais sobre isso na sequência) é válido visitar as redes sociais pessoais dele, se estiverem abertas.
Assim, é possível verificar se há violência ocorrendo lá e também se o próprio aluno dá sinais de depressão ou de outros problemas em suas postagens.
- Observação dos sinais de violência entre os estudantes
O bullying tem consequências muito sérias na saúde mental e até física de uma criança ou adolescente. Isso deixa sinais que permitem à gestão escolar identificar o problema.
Um aluno que sofre bullying pode apresentar os seguintes “sintomas”:
- Excesso de faltas e recusa de ir à escola
- Queda no desempenho nas disciplinas
- Dores de cabeça frequentes
- Muito sono durante as aulas (sinal de dificuldades para dormir em casa)
- Febre e tremores
- Tendência de se isolar dos colegas
- Mudanças de comportamento
- Timidez repentina
As conversas dos alunos também podem dar sinais importantes. Por isso, a observação é o principal caminho para identificar casos de agressão e violência na escola.
Como prevenir e combater o cyberbullying?
Como vimos, o cyberbullying é um problema complexo, que pode ser muito difícil de lidar. No entanto, é responsabilidade da escola criar um ambiente educacional muito mais inclusivo, saudável e seguro para seus alunos.
Algumas boas práticas que sua instituição pode tomar para alcançar esse objetivo são:
- Treinar sua equipe para a prevenção e a ação
O combate ao bullying e ao cyberbullying deve ser uma atividade conjunta de toda a equipe. Só assim será possível prevenir, identificar e combater as situações de agressão de forma efetiva.
Por isso, busque capacitações para a equipe, faça reuniões e troque experiências sobre o tema.
- Aumente o engajamento das famílias com a escola
Pais e responsáveis também podem ajudar muito no combate ao cyberbullying. Afinal, são eles que acompanham os alunos fora da escola e são capazes de reconhecer muitos dos sinais de problemas.
Além disso, contar com uma família engajada facilita muito na hora de conscientizar os estudantes e também ao lidar com problemas que já ocorreram, seja protegendo uma vítima, conscientizando um agressor ou orientando os demais.
- Conscientizar a comunidade escolar
A conscientização é parte fundamental do combate à violência em todas as suas formas. Por isso, a gestão deve trabalhar o tema do cyberbullying com a comunidade escolar.
Isso não significa simplesmente ter um dia ou semana do combate ao bullying. A conscientização deve ser um processo permanente na escola, aparecendo inclusive no projeto político-pedagógico (PPP) da instituição.
É importantíssimo ter palestras e apresentações sobre o assunto, contando com vídeos, exemplos reais (preferencialmente omitindo o nome dos envolvidos) e filmes que tratem do tema.
A escola também deve promover espaços democráticos e rodas de conversa em que a comunidade escolar possa sentir-se à vontade para discutir os problemas do cotidiano.
Além disso, é válido realizar conversas individualizadas com cada estudante. Isso pode ser trabalhoso, mas é uma excelente forma de criar um relacionamento positivo com os alunos, descobrir possíveis problemas e conscientizar sobre a situação do bullying.
Nesse sentido, a escola ainda pode se apresentar como um lugar seguro, em que as vítimas podem buscar apoio e proteção, por meio da equipe pedagógica.
- Estimular a criação de uma escola diversa e inclusiva
A pesquisa citada anteriormente mostra que o bullying é uma violência realizada geralmente contra aparências e comportamentos específicos e minoritários. Por isso, o desenvolvimento de um ambiente inclusivo é uma excelente estratégia para combater esse problema.
Afinal, quando seus alunos entendem que a diversidade é algo bom, positivo e enriquecedor, o risco do bullying se torna muito menor.
Leia mais:
- Como sua escola pode ser mais diversa e inclusiva?
- Por que as escolas devem trabalhar a representatividade por meio de coletivos?
- Como trabalhar as diferenças na escola e promover o respeito entre os alunos
- Trabalhar as competências socioemocionais
O problema do bullying envolve a dificuldade que crianças e adolescentes têm em lidar com os próprios sentimentos e com sua relação com o restante da sociedade. Afinal, a idade escolar é repleta de transformações e, às vezes, é desafiador lidar com elas.
Em situações extremas, essa dificuldade leva a relacionamentos problemáticos, agressões, depressão, ansiedade etc.
Por isso, é fundamental trabalhar as competências socioemocionais na escola. Elas ajudam a formar estudantes com autoconhecimento e capacidade para lidar com as próprias emoções.
Com uma boa formação socioemocional, o bullying se torna mais raro, pois a violência geralmente é uma expressão de um problema pelo qual o agressor está passando.
Além disso, a educação socioemocional prepara os estudantes de forma que, caso ocorra uma situação de cyberbullying, a vítima possa ser menos afetada pela agressão.
- Amparar vítima e agressor
Em casos de bullying, a escola deve avisar pais e responsáveis, além de oferecer suporte pedagógico e/ou psicológico para a vítima.
Além disso, é preciso dar amparo ao agressor. Afinal, ele também é uma criança ou adolescente, que está usando o bullying como uma forma de expressar seus próprios problemas.
Por isso, se possível, o ideal é trabalhar essa agressão não de forma punitivista, e sim por meio da conscientização, responsabilizando o agressor, mas buscando trabalhar com o diálogo e com foco na mudança de comportamento.
Em alguns casos, contudo, pode ser importante acionar o poder público, seja por meio da polícia ou do conselho tutelar, dependendo da situação.
Em todos os casos, no entanto, é fundamental contatar a família de todos os envolvidos. Por isso, busque ter uma excelente comunicação entre escola, alunos, pais e responsáveis.
Carla Helena Lange
Líder de Marketing