No início de 2023, uma série de ataques às escolas no Brasil ganhou os noticiários, deixou pais e alunos amedrontados e acendeu um alerta aos gestores escolares: é preciso pensar em segurança como prioridade e prevenir a violência na escola.
Até então, mesmo com o aumento da violência urbana, as escolas ficavam fora desse índice, portanto o cuidado básico tinha sido suficiente.
Com os ataques, entrou na pauta, por exemplo, segurança armada nas entradas escolares, reforço de ronda policial nas redondezas das instituições de ensino, treinamento de defesa para professores e até a implementação de botão do pânico, como no app Sponte Agenda Plus.
No entanto, essa onda de ataques é apenas um dos itens do cardápio de violência escolar que o país enfrenta há tanto tempo.
Para se ter uma ideia, o levantamento global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que o Brasil está entre os países com índices mais altos do mundo em agressões contra professores.
Sobre bullying, neste mesmo levantamento, 28% dos diretores escolares brasileiros dizem ter testemunhado situações de intimidação ou bullying entre alunos, o dobro da média global.
Sendo assim, é possível observar várias camadas de violência dentro das escolas.
Mas como combater esse problema? O que a escola deve fazer para ser um ambiente pacífico, de educação e amizade. É sobre isso que vamos falar neste artigo.
De acordo com a definição da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - Unesco, a violência escolar pode ser definida como toda ação ou omissão que cause ou vise causar dano à escola, à comunidade escolar ou a algum de seus membros.
Como fenômeno social, a violência escolar é objeto de vários estudos de educadores, sociólogos e pesquisadores das ciências humanas. Entre eles, o francês Bernard Charlot diferencia a "violência na escola", a "violência à escola" e a "violência da escola". Para ele:
De acordo com a cartilha “Violência Escolar: conhecer para prevenir”, do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia da Paraíba, há várias manifestações e formas para a violência. Entre elas estão:
É importante lembrar que a violência escolar não está limitada ao espaço físico da escola. Ou seja, além da sala de aula, pátio, corredores, quadras e banheiros, ela também pode ser cometida no entorno da escola, no deslocamento da escola para casa, durante passeios e atividades escolares externas.
Outro ponto de muita relevância é o cyberbullying, quando a violência ocorre em ambiente virtual. Os dados sobre violência digital são alarmantes.
Conforme consta na lei Nacional de Diretrizes e Bases da Educação, o cyberbullying se caracteriza pela falta de compaixão, tolerância e respeito em ambiente virtual. E, de acordo um levantamento realizado em 2019 pelo Instituto Ipsos, o Brasil é o segundo país no ranking desta violência, ficando atrás apenas da Índia.
No estudo, 29% dos pais ou responsáveis brasileiros que responderam à pesquisa relataram que os filhos já foram vítimas de violência online.
Outro levantamento, desta vez realizado pela Intel Security, empresa vinculada à Intel Inside, colheu dados com crianças e adolescentes com idades entre 8 e 16 anos para entender como o bullying é praticado em ambientes virtuais. Entre as respostas:
Do último grupo:
Leia mais: Como a gestão escolar deve lidar com o cyberbullying.
A violência escolar pode ter vários tipos de motivação, que também vêm de vários lugares sociais distintos, como veremos a seguir:
A Unesco chama a atenção para várias consequências causadas pela violência na escola apontadas pela literatura. Entre elas, cita:
Diante de tantos números e consequências desastrosos, é imprescindível que todas as escolas pensem em uma forma de conter a violência, criando um ambiente pacífico e seguro para quem a frequenta.
Aliás, ambientes seguros, em geral, não são criados por guarda armada no portão. Esse tipo de decisão acaba deixando o clima ainda mais tenso dentro da instituição de ensino, como se todos estivessem em alerta para um perigo iminente. Mas o monitoramento por câmera, por exemplo, pode ser uma boa ideia.
Mas, no dia a dia, é possível tomar uma série de ações que vão cortar a violência da sua escola pela raiz. Confira:
Diante de uma prática de bullying, é mais comum que os alunos finjam não ver o que está acontecendo com medo de que a violência vire contra eles. Há ainda os que se juntam ao aluno/ grupo violento como forma de fugir de futuros ataques – ou porque acham legal e divertido humilhar outras pessoas.
Como o bullying quase nunca acontece na frente de um professor ou funcionário da escola, é preciso incentivar que quem presencie a violência não fique indiferente diante dela, auxiliando a escola a identificar o problema. Pode ser por meio de denúncia anônima, por exemplo, em canais especialmente criados para isso.
Outra informação relevante, que pode ser repassada pelos professores, é que, quando a vítima é defendida pelos colegas, as intimidações tendem a diminuir.
Existem sinais que indicam violência escolar. Fique atento em:
A educação brasileira é regida por documentos oficiais, entre eles a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), as Diretrizes Nacionais para Educação em Direitos Humanos e, acima de todos os demais, a Constituição Federal.
Todos eles têm algo em comum: balizam a educação para um estado democrático de direito, respeitando os direitos humanos, a diversidade e a pluralidade.
Sendo assim, é determinado por lei que as políticas escolares precisam ser construídas em cima dessas premissas.
A partir daí, é necessário estabelecer um código de conduta, com regras disciplinares claras, para que todos os alunos, assim como os funcionários e espaço físico, sejam integralmente respeitados.
É interessante também que o trabalho coletivo seja incentivado de maneira participativa para que todos se sintam parte de um todo.
Envolver toda a comunidade escolar em projetos a longo prazo contra a violência é uma ótima forma de promover a segurança no ambiente escolar. Afinal, essa é uma responsabilidade de todos.
Sendo assim, organize um comitê formado por funcionários, alunos e seus responsáveis. As reuniões podem ser mensais e as conversas podem evoluir para projetos e programas de prevenção à violência.
Esse grupo pode ser responsável, por exemplo, por fazer uma avaliação da violência escolar, levantar as necessidades de segurança da escola e observar continuamente as situações de conflito para criar estratégias de combate.
A escola pode fazer palestras, campanhas preventivas, rodas de conversa, troca de vivências, entre outras práticas.
Algumas práticas levam à resolução pacífica dos conflitos, e elas devem ser incentivadas pela escola. Entre elas:
Para eliminar o mal pela raiz, a escola deve apostar na criação de uma cultura pacífica, formando um ambiente de paz.
Conforme o artigo “Criando uma cultura de paz”, publicado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG):
“A cultura de paz diz respeito a uma visão de mundo que privilegia o diálogo e a mediação para resolver conflitos, abandonando atitudes e ações violentas e respeitando a diversidade dos modos de pensar e agir”.
Já o coordenador do Núcleo de Estudos e Formação de Professores em Educação para a Paz e Convivências (NEP), da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Nei Alberto Salles Filho, explicou, em sua tese, que a cultura de paz abriga cinco campos:
Ou seja, não basta a escola pedir para a criança desenhar elementos de paz, cantar músicas positivas ou dar abraço coletivo em árvore, é preciso criar uma rotina respeitosa, de envolvimento emocional com o local e seus conviventes.
Por fim, o mais importante é dar atenção à saúde mental de seus alunos e funcionários: dos zeladores aos gestores, professores, coordenadores, todos fazem parte da rotina da escola, e quando algum ato de violência atinge a um, o mal estar é generalizado.
Ninguém vai à escola sofrer violência. Por isso, é importante disseminar informações acerca de saúde mental e a importância de cuidar de si e do outro. Quando esse conhecimento é absorvido, eles começam a fazer sentido e utilizar para melhorar o ambiente à sua volta.