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Violência na escola: combate, prevenção e segurança | Sponte

Escrito por Carla Helena Lange | Jul 6, 2023 3:00:00 AM

No início de 2023, uma série de ataques às escolas no Brasil ganhou os noticiários, deixou pais e alunos amedrontados e acendeu um alerta aos gestores escolares: é preciso pensar em segurança como prioridade e prevenir a violência na escola. 

Até então, mesmo com o aumento da violência urbana, as escolas ficavam fora desse índice, portanto o cuidado básico tinha sido suficiente. 

Com os ataques, entrou na pauta, por exemplo, segurança armada nas entradas escolares, reforço de ronda policial nas redondezas das instituições de ensino, treinamento de defesa para professores e até a implementação de botão do pânico, como no app Sponte Agenda Plus

No entanto, essa onda de ataques é apenas um dos itens do cardápio de violência escolar que o país enfrenta há tanto tempo. 

Para se ter uma ideia, o levantamento global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta que o Brasil está entre os países com índices mais altos do mundo em agressões contra professores. 

Sobre bullying, neste mesmo levantamento, 28% dos diretores escolares brasileiros dizem ter testemunhado situações de intimidação ou bullying entre alunos, o dobro da média global.

Sendo assim, é possível observar várias camadas de violência dentro das escolas.

Mas como combater esse problema? O que a escola deve fazer para ser um ambiente pacífico, de educação e amizade. É sobre isso que vamos falar neste artigo.

Tipos de violência escolar

De acordo com a definição da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - Unesco, a violência escolar pode ser definida como toda ação ou omissão que cause ou vise causar dano à escola, à comunidade escolar ou a algum de seus membros.

Como fenômeno social, a violência escolar é objeto de vários estudos de educadores, sociólogos e pesquisadores das ciências humanas. Entre eles, o francês Bernard Charlot diferencia a "violência na escola", a "violência à escola" e a "violência da escola". Para ele:

  • A violência na escola refere-se a situações violentas no ambiente escolar, mas sem estar relacionada às atividades escolares em si.
  • Violência à escola pode ser caracterizada por insultos aos professores, vandalismo, danos ao patrimônio e outros tipos de agressão nesse sentido.
  • Violência da escola são práticas utilizadas pela instituição escolar, como preconceitos, estereótipos, abuso de poder e injustiças com os estudantes.

Manifestações e formas da violência na escola

De acordo com a cartilha “Violência Escolar: conhecer para prevenir”, do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia da Paraíba, há várias manifestações e formas para a violência. Entre elas estão:

  • Violência física: engloba atos como empurrar, bater e chutar, podendo inclusive resultar em homicídio.
  • Violência psicológica/moral: inclui os insultos, ofensas, ameaças, discriminações, humilhações e exclusão social.
  • Violência sexual: abarca atos violentos de cunho sexual, como o assédio, a importunação e o estupro.
  • Violência patrimonial: envolve atos como furtos, roubos, destruição de bens, vandalismo e depredação.
  • Negligência: consiste na omissão, na falta de cuidado e na inobservância de deveres e obrigações.
  • Bullying: atos violentos praticados de maneira repetitiva por um ou mais indivíduos contra um ou mais membros da comunidade escolar.
  • Cyberbullying: modalidade de bullying praticada no meio virtual (redes sociais, aplicativos, e-mail etc.), que visa constranger, humilhar, assustar e enfurecer as vítimas.
  • Trote Violento: atos abusivos geralmente praticados por veteranos contra calouros, com o pretexto de promover a integração dos alunos recém-ingressos.

Dentro e fora da escola

É importante lembrar que a violência escolar não está limitada ao espaço físico da escola. Ou seja, além da sala de aula, pátio, corredores, quadras e banheiros, ela também pode ser cometida no entorno da escola, no deslocamento da escola para casa, durante passeios e atividades escolares externas. 

Outro ponto de muita relevância é o cyberbullying, quando a violência ocorre em ambiente virtual. Os dados sobre violência digital são alarmantes. 

Atenção ao cyberbullying

Conforme consta na lei Nacional de Diretrizes e Bases da Educação, o cyberbullying se caracteriza pela falta de compaixão, tolerância e respeito em ambiente virtual. E, de acordo um levantamento realizado em 2019 pelo Instituto Ipsos, o Brasil é o segundo país no ranking desta violência, ficando atrás apenas da Índia. 

No estudo, 29% dos pais ou responsáveis brasileiros que responderam à pesquisa relataram que os filhos já foram vítimas de violência online. 

Outro levantamento, desta vez realizado pela Intel Security, empresa vinculada à Intel Inside,  colheu dados com crianças e adolescentes com idades entre 8 e 16 anos para entender como  o bullying é praticado em ambientes virtuais. Entre as respostas:

  • 21% afirmam ter sofrido cyberbullying
  • 66% presenciaram casos de agressão na internet
  • 24% realizaram atos considerados cyberbullying 

Do último grupo:

  • 14% falaram mal de uma pessoa para outra
  • 13% zombaram alguém por sua aparência
  • 7% marcaram alguém em fotos vexatórias
  • 3% ameaçaram alguém
  • 3% zombaram alguém por conta de sua sexualidade
  • 2% postaram intencionalmente sobre eventos em que um colega foi excluído para ele perceber que foi excluído.

Leia mais: Como a gestão escolar deve lidar com o cyberbullying.

Qual é a motivação da violência na escola?

 A violência escolar pode ter vários tipos de motivação, que também vêm de vários lugares sociais distintos, como veremos a seguir:

  • Baixa autoestima do aluno
  • Dificuldade em lidar com as diferenças
  • Bullying
  • Busca pela fama e idolatria
  • Ambiente familiar instável
  • Autoafirmação
  • Narrativas maniqueístas, conspiracionistas e de ódio
  • Transferência do papel dos pais na educação dos filhos
  • Acúmulo de funções por parte do educador
  • Falta ou insuficiência de políticas públicas

De olho nas consequências

A Unesco chama a atenção para várias consequências causadas pela violência na escola apontadas pela literatura. Entre elas, cita:

  • Problemas de ensino-aprendizagem
  • Problemas de convivência
  • Fracasso escolar
  • Evasão escolar
  • Ansiedade
  • Depressão
  • Estresse
  • Irritabilidade
  • Pensamentos suicidas

Como resolver o problema da violência na escola?

Diante de tantos números e consequências desastrosos, é imprescindível que todas as escolas pensem em uma forma de conter a violência, criando um ambiente pacífico e seguro para quem a frequenta.

Aliás, ambientes seguros, em geral, não são criados por guarda armada no portão. Esse tipo de decisão acaba deixando o clima ainda mais tenso dentro da instituição de ensino, como se todos estivessem em alerta para um perigo iminente. Mas o monitoramento por câmera, por exemplo, pode ser uma boa ideia. 

Mas, no dia a dia, é possível tomar uma série de ações que vão cortar a violência da sua escola pela raiz. Confira:

Incentive que seus alunos não fiquem indiferentes diante do bullying

Diante de uma prática de bullying, é mais comum que os alunos finjam não ver o que está acontecendo com medo de que a violência vire contra eles. Há ainda os que se juntam ao aluno/ grupo violento como forma de fugir de futuros ataques – ou porque acham legal e divertido humilhar outras pessoas.

Como o bullying quase nunca acontece na frente de um professor ou funcionário da escola, é preciso incentivar que quem presencie a violência não fique indiferente diante dela, auxiliando a escola a identificar o problema. Pode ser por meio de denúncia anônima, por exemplo, em canais especialmente criados para isso.

Outra informação relevante, que pode ser repassada pelos professores, é que, quando a vítima é defendida pelos colegas, as intimidações tendem a diminuir.

Identifique como está a violência dentro da sua escola

Existem sinais que indicam violência escolar. Fique atento em: 

  • Crianças que faltam demais.
  • Alunos com livros e cadernos rasgados.
  • Alunos que apresentam queda brusca no rendimento escolar.
  • Alunos/grupo de alunos que ficam muito isolados.
  • Depredação do espaço escolar.
  • Comportamentos de ódio/ameaça.
  • Questionamentos excessivos, além da curiosidade.
  • Discurso de ódio e intolerância.

Estabeleça e siga políticas e diretrizes contra a violência

A educação brasileira é regida por documentos oficiais, entre eles a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), as Diretrizes Nacionais para Educação em Direitos Humanos e, acima de todos os demais, a Constituição Federal.

Todos eles têm algo em comum: balizam a educação para um estado democrático de direito, respeitando os direitos humanos, a diversidade e a pluralidade. 

Sendo assim, é determinado por lei que as políticas escolares precisam ser construídas em cima dessas premissas. 

A partir daí, é necessário estabelecer um código de  conduta, com regras disciplinares claras, para que todos os alunos, assim como os funcionários e espaço físico, sejam integralmente respeitados. 

É interessante também que o trabalho coletivo seja incentivado de maneira participativa para que todos se sintam parte de um todo. 

Crie um comitê de segurança e programas de prevenção à violência na escola

Envolver toda a comunidade escolar em projetos a longo prazo contra a violência é uma ótima forma de promover a segurança no ambiente escolar. Afinal, essa é uma responsabilidade de todos.

Sendo assim, organize um comitê formado por funcionários, alunos e seus responsáveis. As reuniões podem ser mensais e as conversas podem evoluir para projetos e programas de prevenção à violência.

Esse grupo pode ser responsável, por exemplo, por fazer uma avaliação da violência escolar, levantar as necessidades de segurança da escola e observar continuamente as situações de conflito para criar estratégias de combate.

A escola pode fazer palestras, campanhas preventivas, rodas de conversa, troca de vivências, entre outras práticas.  

Estimule a resolução pacífica de conflitos

Algumas práticas levam à resolução pacífica dos conflitos, e elas devem ser incentivadas pela escola. Entre elas:

  • Incentivar o debate: quando se aprende a debater econversar sobre pontos de vista diferentes, os alunos aprendem a dialogar.
  • Criar uma relação de escuta: quando é escutado, o aluno consegue externalizar seu estresse e o professor consegue orientá-lo de forma adequada sobre quais providências tomar. 
  • Evitar punições e sanções severas: punir estimula ainda mais a violência. É preciso encontrar um ponto de equilíbrio para evitar um ambiente hostil.
  • Estimular o acolhimento coletivo: muitas vezes, os alunos conseguem intervir de forma diferente do professor, propondo experiências que fazem parte da sua rotina, mas não dos adultos. 
  • Incentivar os pais ao elogio: a aceitação dos pais é muito importante. Quando a escola incentiva que os pais elogiem os seus filhos, muitas inseguranças deixam de existir. 

Criando uma cultura de paz

Para eliminar o mal pela raiz, a escola deve apostar na criação de uma cultura pacífica, formando um ambiente de paz.

Conforme o artigo “Criando uma cultura de paz”, publicado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG): 

“A cultura de paz diz respeito a uma visão de mundo que privilegia o diálogo e a mediação para resolver conflitos, abandonando atitudes e ações violentas e respeitando a diversidade dos modos de pensar e agir”.

Já o coordenador do Núcleo de Estudos e Formação de Professores em Educação para a Paz e Convivências (NEP), da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Nei Alberto Salles Filho, explicou, em sua tese, que a cultura de paz abriga cinco campos: 

  • valores humanos
  • educação para direitos humanos
  • mediações de conflito e práticas restaurativas
  • valorização do meio ambiente 
  • convivências escolares

Ou seja, não basta a escola pedir para a criança desenhar elementos de paz, cantar músicas positivas ou dar abraço coletivo em árvore, é preciso criar uma rotina respeitosa, de envolvimento emocional com o local e seus conviventes. 

Cuide da saúde mental de todos na escola

Por fim, o mais importante é dar atenção à saúde mental de seus alunos e funcionários: dos zeladores aos gestores, professores, coordenadores, todos fazem parte da rotina da escola, e quando algum ato de violência atinge a um, o mal estar é generalizado. 

Ninguém vai à escola sofrer violência. Por isso, é importante disseminar informações acerca de saúde mental e a importância de cuidar de si e do outro. Quando esse conhecimento é absorvido, eles começam a fazer sentido e utilizar para melhorar o ambiente à sua volta.