A metodologia Reggio Emilia se destaca entre as mais populares abordagens pedagógicas na educação básica. Também conhecida como pedagogia da escuta, ela nasceu na Itália no pós-Segunda Guerra Mundial e se espalhou pelo mundo.
Para entender o motivo do sucesso dessa abordagem entre as metodologias educacionais alternativas e saber como aplicar Reggio Emilia no seu dia a dia escolar, continue a leitura e confira:
Reggio Emilia é uma abordagem pedagógica criada pelo educador Loris Malaguzzi, na Itália, após o fim da Segunda Guerra Mundial — conflito em que o país foi derrotado, após anos de ditadura fascista.
Em meio à devastação do pós-Guerra, o educador propunha uma educação voltada à escuta das crianças, em um ambiente acolhedor, que pudesse ajudar na criação de uma sociedade mais participativa, solidária e proativa, que se afastasse do passado fascista.
O desenvolvimento infantil com Reggio Emilia considera que os alunos já pensam e podem investigar e expressar suas próprias visões de mundo, a partir de várias diferentes linguagens.
A abordagem pedagógica leva em conta tanto a individualidade quanto o potencial de cada criança, vista como um ser autônomo e o verdadeiro protagonista da própria aprendizagem.
Para além disso, a metodologia Reggio Emilia também valoriza a arte e trata da organização do espaço físico e da própria construção dos processos pedagógicos. Em vez de seguir modelos prontos em sua gestão pedagógica, ela propõe que o ensino deve ser construído de forma participativa.
Desde o início, essa abordagem já se mostrava radicalmente diferente do ensino tradicional, e a novidade se expandiu.
Reggio Emilia, a cidade que deu nome à abordagem, hoje recebe milhares de educadores do mundo todo para formação continuada. E a metodologia segue evoluindo e se atualizando com esses professores.
Aqui no blog da Sponte, apresentamos uma lista que mostra, de forma abreviada, as principais abordagens pedagógicas. Você pode conferi-la neste link: Quais são as principais abordagens pedagógicas e como escolher a melhor para sua escola?
A aplicação da abordagem Reggio Emilia na escola se baseia em alguns valores que continuam muito relevantes no cenário educacional atual.
Esses valores podem ser vistos como os princípios da metodologia Reggio Emilia e tem foco em elementos como a expressão criativa, a escuta da criança e a valorização da aprendizagem colaborativa.
Nesse sentido, eles partem das ideias do fundador da metodologia, o educador Loris Malaguzzi. “Criar uma escola amável, diligente, inventiva, habitável, documentável e comunicável, um lugar de pesquisa, aprendizagem, reconhecimento e reflexão, onde crianças, professores e famílias se sintam bem — esse é o nosso ponto de chegada”, diz Malaguzzi.
Vamos detalhar esses valores nos próximos parágrafos, de acordo com a apresentação presente no próprio site internacional da abordagem. Continue sua leitura e veja como aplicar Reggio Emilia em sua escola.
O primeiro valor destacado pela metodologia Reggio Emilia é o objetivo de tornar as crianças protagonistas ativas de seu próprio processo de crescimento.
De acordo com a abordagem, as crianças são “equipadas com potenciais extraordinários para a aprendizagem”. E esses potenciais se manifestam por meio do convívio e das trocas com o contexto cultural e social.
Já falamos aqui sobre a importância do protagonismo e da autonomia dos estudantes.
🔎 Leia mais: Aluno protagonista: 12 passos para desenvolver esse conceito em sua escola.
Mas isso fica ainda mais destacado na proposta de desenvolvimento infantil com Reggio Emilia. A abordagem propõe que as crianças são sujeitos de direitos e que elas são capazes de construir experiências e atribuir sentido a elas, seja nas relações com o grupo, seja individualmente.
Progettazione é uma palavra em italiano, língua original da metodologia Reggio Emilia. Em uma tradução direta, ela significa projeto, projetar ou desenhar algo — e essa é uma das ideias centrais da abordagem pedagógica.
Na prática, a ideia de Progettazione propõe que a ação educacional não deve ser moldada por programas predefinidos. Em vez disso, ela deve ser projetada dentro da realidade escolar, respeitando os processos de aprendizagem dos alunos e as condições ambientais e pessoais da escola e de sua equipe.
Nesse tipo de proposta pedagógica, a dúvida, a incerteza e o erro são aceitos e tidos como recursos que podem somar na evolução da aprendizagem.
A construção da educação, portanto, acontece por meio da observação, documentação e interpretação do dia a dia educacional, além da busca por uma sinergia entre a organização do trabalho e a pesquisa educacional.
A metodologia Reggio Emilia propõe que “crianças, como seres humanos, possuem uma centena de linguagens: uma centena de formas de pensar, expressar, compreender, de encontrar a alteridade por meio de uma forma de pensar que costura e não separa as várias dimensões da experiência”.
Essa ideia das 100 linguagens é uma metáfora para apresentar os “potenciais extraordinários das crianças, sua construção de conhecimento e seu processo criativo”. Processos que envolvem formas diferentes de pensar, brincar, fazer e viver.
Assim, na Reggio Emilia, é função da escola valorizar todas as linguagens verbais e não verbais com a mesma dignidade.
Essa proposta é reforçada por um poema escrito pelo próprio educador Loris Malaguzzi, que critica a educação tradicional que “poda” essas linguagens das crianças, forçando-as a encaixarem-se em um molde. E a metodologia Reggio Emilia propõe quebrar esse molde com uma educação libertadora.
No contexto da Reggio Emilia, a organização tem parte fundamental no processo educacional. Isso envolve a organização do trabalho, dos espaços da escola, do tempo das crianças e dos adultos.
Todos esses elementos são “estruturalmente parte dos valores e decisões do projeto educacional.”
Assim, a abordagem pedagógica dá relevância inclusive às condições de trabalho de sua equipe e também à construção de uma rede de responsabilidades nas diferentes áreas da gestão escolar.
Junto à organização, a Reggio Emilia valoriza também a gestão participativa no ambiente educacional.
O site da metodologia deixa claro que “participação é a estratégia educacional construída e vivida no encontro e nas relações dia após dia”.
Ele ainda integra essa premissa com as cem linguagens, que são fundamentais à abordagem pedagógica: “a participação valoriza e utiliza as cem linguagens das crianças e seres humanos, compreendidas como pluralidade de pontos de vista e culturas”.
O resultado é solidariedade, responsabilidade e inclusão no desenvolvimento infantil com a metodologia Reggio Emilia.
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O ambiente também tem um papel relevante entre os princípios da metodologia Reggio Emilia. Ele é visto como um “terceiro educador”, que pode fomentar a autonomia e a curiosidade das crianças.
De fato, os espaços de escolas que seguem essa metodologia educacional alternativa são organizados de forma interconectada. Eles devem servir às crianças — e aos adultos — não apenas como espaços de lição, mas sim como lugares para conviver e pesquisar, e que reflitam a realidade dos alunos.
Segundo a metodologia, “o ambiente interage, modifica e toma forma em relação aos projetos e às experiências de aprendizagem, em um diálogo constante entre arquitetura e pedagogia”.
Ela indica ainda que o cuidado com os móveis, objetos e espaços é um ato educacional em si só, “que gera bem-estar psicológico, um senso de familiaridade e pertencimento, sentimento estético e o prazer de habitar” o espaço. Além das condições de trabalho e segurança no ambiente escolar.
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O processo de aprendizagem na metodologia Reggio Emilia “privilegia estratégias de pesquisa, trocas e discussões, e a participação com outros”.
Nesse sentido, cada criança é um construtor de conhecimentos, de forma compartilhada com os colegas e com a equipe da escola.
A formação continuada é parte fundamental desta abordagem pedagógica e está entre os princípios da metodologia Reggio Emilia. E não só ela: treinamentos e crescimento profissional são vistos tanto como direito quanto como dever de cada trabalhador.
Um grande foco da metodologia é a pesquisa. De fato, ela é tida como “uma das dimensões de vida essenciais para crianças e adultos”.
Por isso, o desenvolvimento infantil com Reggio Emilia dá prioridade às atividades de pesquisa, como uma prática diária. A pesquisa entre adultos e crianças é tida como “uma atitude necessária para interpretar a complexidade do mundo, e um instrumento poderoso de renovação na educação”.
O processo de avaliação não é visto pela metodologia Reggio Emilia simplesmente como uma forma de medir os conhecimentos dos alunos. Ela também envolve avaliar a experiência de educação e de gerir a escola.
Para isso, a abordagem pedagógica apresenta ferramentas como a carta de serviços, os conselhos infantis da cidade, a coordenação pedagógica, a participação das famílias e da comunidade, entre outras.
A documentação dos processos educacionais é um elemento fundamental da metodologia Reggio Emilia. Ela dá estrutura às teorias e práticas educacionais, e possibilita a avaliação e a evolução dos processos.
Segundo a metodologia, a documentação “torna a natureza do processo de aprendizado visível e avaliável, subjetiva e em grupos, em crianças e em adultos, e transforma-os em um legado comum compartilhado”.
Aqui, a ideia de “pedagogia da escuta” realmente brilha. Afinal, a documentação envolve observar, registrar e refletir sobre as experiências e expressões dos alunos.
Além disso, os registros feitos para a documentação podem incluir várias das linguagens dos alunos. Podem ser textos, gravações de áudios, vídeos, fotografias, relatos dos professores, atividades artísticas, tabelas avaliativas, entre outros.
O que importa é que proporcionem a possibilidade de discutir, interpretar e refletir — junto com as crianças e até com suas famílias.
Há várias metodologias educacionais alternativas disponíveis para uma escola de educação básica. Mas a abordagem Reggio Emilia está entre as principais.
Outra que se destaca é a metodologia Montessori. Já falamos dela aqui: Método Montessori: entenda como usar o estilo montessoriano em suas práticas pedagógicas.
Ambas as abordagens valorizam o protagonismo e a autonomia dos estudantes. No entanto, há diferenças importantes.
A principal entre essas variações é o fato que a Reggio Emilia não tem um currículo específico a ser seguido, diferente do que ocorre na Montessori. Como vimos, o processo educacional na Reggio Emilia é construído em tempo real, por meio do que conhecemos como Progettazione.
De fato, a Montessori se apresenta como uma abordagem mais específica, enquanto a Reggio Emilia age mais como uma filosofia educacional, a ser adequada em diferentes contextos.
O ambiente também é diferente. Por mais que os espaços da Montessori sejam não convencionais, potencializando a exploração e a experimentação dos alunos, eles ainda são bem estruturados. Enquanto isso, na Reggio Emilia, a prioridade é ter ambientes mais flexíveis e abertos.
Há uma diferença importante também no papel dos professores. Na Reggio Emilia, o processo educacional é compartilhado com os alunos, que também ensinam e guiam as aulas, enquanto os professores também aprendem, além de ensinar.
Na Montessori, os professores agem como diretores de educação — mas, em ambas, sempre respeitando a autonomia e o protagonismo dos alunos.
A metodologia Reggio Emilia oferece ganhos importantes ao desenvolvimento infantil. Ao explorar as múltiplas linguagens, por exemplo, ela obviamente melhora a diversidade e a inclusão, mas também potencializa a criatividade, as habilidades sociais e a capacidade dos alunos se comunicarem.
A forma de aprendizado compartilhado também aumenta a autonomia das crianças e ajuda a prepará-las melhor para o mundo fora da escola. Além disso, elas terão mais confiança em suas próprias habilidades, porque aprenderão a ter independência.
O método também estimula o desenvolvimento físico e a educação emocional, ajudando a formar adultos plenos.
Além disso, ele valoriza profundamente a participação das famílias e da comunidade, criando uma escola mais participativa, democrática e com potencial para transformar o seu contexto.
O primeiro passo para aplicar Reggio Emilia na escola é a formação continuada. Sua equipe precisa passar por treinamentos e capacitações que envolvam essa metodologia e práticas de autonomia para os alunos.
Além disso, é preciso pensar em uma educação guiada não apenas pelos professores, mas também pelos alunos. Ainda assim, os professores têm múltiplos papéis fundamentais, seja como pesquisadores junto aos alunos, seja como mentores ou apresentadores de conhecimentos.
Mas, em qualquer desses papéis, ele deve sempre ouvir e registrar a jornada das crianças.
Também é importante adaptar-se aos princípios que já mencionamos, criando ambientes integrados, desenvolvendo a educação de acordo com o contexto, estimulando a participação de todos, e muito mais.
Um exemplo prático para tudo isso é levar as crianças para a cozinha da escola, onde poderão aprender com os cozinheiros e experimentar atividades fora da realidade educacional tradicional — mas sempre com segurança.
Outro exemplo é o uso de brinquedos que as crianças possam montar e desmontar, criando possibilidades diferentes junto aos professores.
E, é claro, essas são apenas algumas das possibilidades. Outra dica importante é integrar os direitos de aprendizado e desenvolvimento da Base Nacional Comum Curricular, que dialogam diretamente com a Reggio Emilia e suas múltiplas linguagem — assim como os campos de experiência da BNCC.
🔎 Leia mais: Tudo sobre a BNCC: sua escola está adequada à nova Base Nacional Comum Curricular?
Além disso, também é possível integrar a Reggio Emilia com outras metodologias e práticas educacionais, como a Montessori, que já vimos aqui neste texto, ou mesmo abordagens brasileiras, que levam em conta nossa realidade, nossa cultura e nossa história.
Leia mais sobre outras abordagens pedagógicas possíveis para sua escola: Quais são as principais abordagens pedagógicas e como escolher a melhor para sua escola?